Encontro com o Toquinho na rua: Zé! O Chiquim
Cabral morreu. Enquanto o amigo conta detalhes; em minha mente, correm
alucinadas imagens e a voz de Francisco Marcelo Cabral. No silêncio posterior, brotam fragmentos de seus
poemas; mas um insiste: A cidade exporta
/ tecidos de algodão que não planta / e poemas que não lê / No varejo de
algumas lojas / se pode até comprar livros. / O jeito é agarrar com todo
cuidado / a primeira palavra vazia / que esvoace gratuita na brisa do / Pomba,
/ e devolvê-la intacta / aos ventos, insanos e surdos. Como
migrante no exílio, em toda casa tem alguém que foi exportado, sempre cantou seu
rio e sua aldeia. A cidade na sua
ruidosa ignorância e provinciana insensibilidade nem se dá conta do que
perdeu. Aliás, como mãe que abandona os teus, não se
mexeu nem para tentar abrigá-lo em seu colo-ventre, mantendo-o eternamente
exilado em terras cariocas.
Chico Cabral, ao lado de Lina Tâmega Peixoto e o verde
Ascânio Lopes formam a Santíssima Trindade da poesia de Cataguases. Ainda aqui,
na Meia Pataca – revista que criou
com Lina Tâmega – já fazia das palavras suas infinitas possibilidades. Na
cidade, têm-se hoje uma gama de ótimos poetas influenciados por eles, a maioria deles, também exportados.
Poetas são
semideuses, escrevem para nós, seus mortais leitores, permitindo-nos ir para
além de nossas impossibilidades. Em seu Livro de poemas (2003), Chico, na orelha, nos diz: “...as palavras são portas de saída mas não
de entrada, e que a emoção ou conceito, presentes num texto, são de quem o lê e
não mais apenas de quem o escreveu. ...” Outro poeta, o palestino Mourid
Barghouti, diz: “Não gosto de pegar na
mão de minhas palavras enquanto atravessam a rua por zelo ou medo excessivo.
...”
Mas, o que para mim os aproxima,
é a poesia do exílio. São distintas suas
sagas e seus contextos. Enquanto Mourid viveu o êxodo da desapropriação e sua expulsão
de Hamallá, pelos israelenses. Chico, num outro tipo de êxodo, foi em busca das
oportunidades que a cidade operária não oferece aos teus. É latente nos dois o
discurso da ausência. Enquanto no palestino vibra uma agressiva e compreensível
verve transformando as palavras em arma de combate, dando voz ao coletivo; em
Chico ponteia a melancolia da ausência de suas montanhas, a saudade dos
granitos irregulares que pavimentam as ruas de suas andanças e o escorrer das
águas amarelas do seu Rio Pomba. Que apesar da aparente solidão de sua dicção é
também a voz de seus conterrâneos desterrados pelo subdesenvolvimento da
região.
Criando assim, com sua alma de poeta, uma
mítica Cataguases que o magnifico Inexílio
é sua expressão maior e definitiva.
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