Tibúrcio

Tibúrcio, já ia lá pelos sessenta e nove anos, mas continuava apregoando aos quatro ventos que tinha cincoenta e poucos anos, enchia o peito e ventava na cara do perguntador com todas as letras cincoenta... Isso mesmo, fazia questão do cincoenta... Cincoenta e poucos anos bem soprados de boca cheia, reforçado pelo bafo da pinga para não deixar duvida da conta no curioso. Machão convicto, ferroviário aposentado, gabava-se de ter sido hospede da pensão de Dona Laura lá em Cachoeiro. Dizia que mulher que virasse a noite com ele amanhecia suspirante e olhos piscantes de contentamento, assim como farolete de fusca com a bateria meio arriada.
Freqüentador lá do pele-e-osso, bailão que tá mais famoso ainda, depois de correr a notícia de que um vendedor de rotidogui , tinha uma carrocinha bem na porta. Era empresário no ramo de segurança e dera uma beiçada de cinqüenta mil contos na prefeitura lá do Rio de Janeiro. Tem muita gente sumida lá do forró, todos meio com medo de ser apanhado em delituosa infedelidade com a patroa. Cisma boba. Vê lá se algum canal de TV vai querer desfiar aquele rosário de astros e estrelas ao avesso. Sapecou Tibúrcio. Mesmo com a freqüência meio caída, o velho marcava presença e batia o ponto todos os dias em que a casa estava aberta. Não era nenhum pé-de-valsa, mas gostava de atravessar a cerca do flerte e bolinar descaradamente nos pertences da mulherada. Marrento. Se achava o máximo. Numa sexta de minguante depois de duas pingas no bar do russo e uns pastéis na dona Selma entrou no pele-e-osso já meio zoado, dois tropicões pra diante vê uma loura encostada em um canto do salão, apertou as vistas, esfregou os olhos, apertou de novo. Né possível. É a Rita Cadillac! Aprumou-se todo e partiu pra cima. A madama me concede uma dança? A tal consentiu com a cabeça. Ao som de um breganejo lá se foram salão a fora. Tibúrcio, maladrão, encoxa daqui, encoxa dali, levou a mão no entre-coxas da “Cadillac”. De repente, se afastou rapidamente como desapartado de briga. Epa! Epa! De mãos ainda pra cima, naquele num sabe se corre num sabe se fica, num misto de raiva e desapontamento disparou: Ô dona, que diabo é isto? Nestes tempos de tanta coisa que a turma esconde nas cuecas. Tibúrcio achando esquisito aquilo, ainda lembrando da malandragem dos antigamente, insistiu: Ô que cê carrega aí no porta-jóias? Entrou em choque com o vozeirão de locutor de rádio que tentava se explicar. Voltou a ter tino da situação. Saiu de perto e, se mandou escada abaixo xingando. Putaquipariu nunca imaginei a Rita Cadilac com um diferencial daquele tamanho no vão das pernas. Viadim filadaputa.

Um comentário:

José Geraldo Gouvea disse...

Delicioso conto "baseado em fatos reais"! Foi só ler esse e querer acompanhar o blogue para quando vier mais...

Abrações do xará desterrado na cidade-irmã...