O Estudibeique do Estainbeque



                    A algum tempo...       Num destes domingos, em que pela manhã corre a fórmula um, sentado ali no bar da esquina para uma cerveja matutina, escuto alguém comentar - Estas corridas, depois da morte do Sena não tem mais tesão!     Comentários diversos sobre a monotonia, já que só dá o alemão.   Viajo na minha maquina do tempo, a já vacilante memória, cheia de atos falhos, mais parecendo um forde vinte nove.  Um amigo engenheiro me disse que é pane neuroelétrica, por falta de oxigênio. Lembro deste país, parando aos domingos pela manhã para assistir o Sena; era exatamente tal e qual o alemão hoje.   País incompetente é assim mesmo, orgasma da espasmódica competência de um ou outro de seus filhos, que feito cometa brilham de tempos em tempos.   A minha maquininha do tempo esquadrinha oscilante os dois tempos, o ontem e o anteontem.   Lembro-me de uma afirmativa de Jon Estainbeque, aquele escritor que dizia - o homem moderno é constituído de cabeça tronco e automóvel, desfilando pelas ruas de Noviorque num possante Estudibeique, e antes que um amiguinho mais letrado me corrija. Já vou logo assumindo.  Se para desespero do Olavo Bilaque, já maltrato inculto a última flor do Lácio.    Imagina o que não faço com a dos saquições   Sendo de fato um analfabeto funcional em português imagine em inglês.    Mas o que me preocupa nesta afirmativa é minha atual situação.   Não tenho carteira de habilitação, nunca tive automóvel, portanto sou um despossuído de tão invejado membro inferior.   Cantarolando aquela musiqueta Cadê meu simca chambord, capítulo primeiro do nosso milagre econômico, a maquininha me faz dar uma passada, pela manhã de  sábado paulistano, num bairro que morei, vejo os jovens lavando seus carros, com aquela delicadeza que se dedica a uma bela mulher numa banheira de espuma, o duro é relembrar aquele roque pesado, quase troglodita, que nos estupravam os ouvidos a manhã inteira, naqueles toca-fitas ruins.       Mas o terrível neste mundo pós-moderno é que na evolução do conceito estainbequiano o homem hoje é constituído de lapitopi, nomezinho besta até para burrice artificial, por enquanto tronco, e automóvel, se bem que tem uns pernetas que preferem uma moto. Eu que já era só cabeça e tronco agora vou ficando reduzido só ao tronco. Num surrealista delírio etílico surge na rua do sobe e desce um estudibeique, para em frente a mim, e o Estainbeque em pessoa me convida para uma volta pela cidade, quer que o guie pelas ruas para conhecer as trilhas dos modernistas de vinte e tantos.  Alguém me cutuca e curtocicuita a maquininha.  É o Vanderlei Pequeno, velho companheiro de copo, militância e rabiscaria.   Estainbeque e o estudibeique são deletados. 


Publicado em  "A Casa da Rua Alferes e outras crônicas" 

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