“Justiça para quem precisa de justiça”



Viaduto Santa Ifigênia São Paulo, meados de 1980. Eu trabalhava ali na Superintendência do IAPAS. De cima do viaduto acompanhei com amigos e vimos um milhão de pessoas no Anhangabaú, exigindo o seu direito de escolher seu presidente. Foi o último comício das diretas já. Duas decepções depois, a primeira foi a traição do congresso negando-nos o voto para presidente. A segunda foi a forma e o conteúdo que levaram Sarney ao poder.  No poder, mas sem apoio algum do povo. Tentou com seu plano cruzado - uma ilusão ou outra tentativa de acabar com a inflação por decreto - conquistar apoio popular. O velho xerife Tuma do Dops não tendo mais comunistas “comedores de criancinhas” para prender, foi caçar boi no pasto, o subversivo do cruzado. Durante algum tempo muita gente se empolgou e foram prá rua fiscalizar de tablita na mão os preços. Eram os fiscais do Sarney de broche na lapela e tudo.    Deu no deu.  A inflação nas alturas e o povo sifu.
Como já disse eu trabalhava no IAPAS. Certo dia, desta efervescente época, o secretário de engenharia lá no 5º andar, solicitou a duas secretárias e ao Mairton, colega de trabalho cearense lá de Acaraú, que localizassem o Doutor Miragaia com urgência. O tal doutor era um dos procuradores da previdência. Precisava-se dele para um parecer em um processo de dação de pagamento. Os três, por telefone, tentavam localizar o servidor público em vários locais. Vagueavam entre a procuradoria e a residência do cidadão e tudo em vão. Depois de tantas ligações, as secretárias da procuradoria já sem respostas vazavam uma ou outra dica: Liga para o Banco Auxiliar ele costuma fazer umas consultorias lá. Mais um monte de ligações e: Liga no Banco Comind... Quem sabe no banco.... Assim, por dois dias, foram descobrindo que o doutor procurador fazia bicos num punhado de bancos pequenos, o curioso é que todos desapareceram da paisagem com o passar dos tempos. Enfim, já no final do expediente do segundo dia, Mairton encontra o procurador. Doutor Miragaia boa tarde! Puxa doutor faz dois dias que estamos tentando falar com o senhor na procuradoria. O procurador não perde a pose e numa voz empolada responde: Meu jovem! Sou procurador vinte e quatro horas por dia. Mairton já invocado com aquilo tudo não perdoou: Mas nós queríamos encontrá-lo só por um ou dois minutos na procuradoria.
Estas lembranças me ocorreram ao ler um artigo de Nelson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, publicado dia 25/04/2011 no Correio Brasiliense em que ele discorre sobre uma deliberação do Conselho Nacional de Justiça sobre o horário de funcionamento da Justiça, determinando que o atendimento seja das 9h às 18h em todo o território nacional indistintamente. E lá pelas tantas afirma: “Se essa assertiva fosse levada às últimas consequências, o Judiciário deveria seguir a jornada do juiz e, assim, ter seu horário estendido para 24 horas por dia, todos os dias da semana. Afinal, se há algo que não pode sofrer interrupção é a distribuição da Justiça.”
Que beleza em! Igualzinho ao doutor Miragaia. Ou o nosso procurador aprendeu no Judiciário ou o nosso Doutor Miragaia deixou seguidores por aí. E aí Mairton? A gente só queria era achar um no fórum só nos dias úteis, e no horário de expediente. Não precisam ter uma jornada tão extenuante. Não é mesmo. Como de uma forma ou de outra tudo se repete. Eu também estou repetindo o título do artigo do Doutor Nelson Calandra.

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